recorte da peça "Memorável Desventura"

Todo o rude peso da suavidade harmônica
Daqueles versos calados frenéticos sem tônica,
Com as sílabas das verdades expressas no opus,
Faziam tremer-lhe a vista à vislumbrar os corpos....

Corpos estes deitados na vastidão, no mistério da imagem,
Enfeitando e acalentando Narciso da margem...

E, suspirante, pela fonte decorada de notas sinistras,
O ar se fez humano, e tangível, sem rastro nem pista,
Ouviu-se então um cântico grotesco, e ante à face no lago,
Tombou-lhe a alma... Cai o corpo do consciente oriundo...

É a vaidade humana - rendida às caprichosas manobras do fascínio,
Que anseia por teu suicídio, como a música Narciso...
Gerando a força motora que sustenta a mente do mundo,
Instintiva e pura, suave e dançante, de majestoso improviso...

Ainda ouço as notas soltas, que se encontram em meio à devoção.
A saudar Narciso, e velar tua paixão...

Gracejos de Amor - II

... ofende a Deus a ímpia elegância
daqueles que julgam o amor, fraqueza
pois nas colinas da divina realeza
Quer o velho amar, sem distância

Assim o faz com tua criação
Ofertando ao homem, ante à razão
Sentidos, desejo e beleza

Aos amantes, a lua posta
de cor pecaminosa, sangue brilhante
Enquanto Ele, sorrindo aposta
que viva a cria teu prazer cintilante...

Gracejos de Amor - I

Tivesse eu com tigres lutado
ou sob o jônico degolado serpentes,
sentir-me-ia menos culpado
por amar assim, severamente...

Foi o encantamento voráz do repente
que a fez surgir na taberna ao meu lado...
Mefistofélica noite de sonhos ardentes,
fáustica esperança de fugir alado...

Por meses cavalguei jactante
atrás do cheiro de romã pulsante
atrás do rastro da bela passante...

Atrás da semideusa de olhar fremente
que tornou meu céu mais fulgurante
e meu ser mais inconsciente...

minha mulher, minha amante.