calo

paro em mim - este eu lá fora

sem fórmulas, magias
formas e dias
ideias e versos
leis e nexos

falta a falta
que tanto me sobra

e ar, pra engolir a seco

é tanto beco
na Rua Ontem, sem saída

e tanto bote
no Cargueiro Amanhã

e pouco mato
na Lavoura Agora

e cinza toda vida

de esperança e lida
que morta, cala
e muda, resvala
na dor

desaprendo a ler
me foge a regra
me escapa a trégua
sou pavor

silencio a letra
renuncio à mim
neste último rabisco:

fim





LENÇO BRANCO ALVA


Lenço branco alva no pescoço liso teu

Leve, livre vai, que te leve ao toque meu

Levo o branco nosso e aposto que viveu

No pescoço que se atraca, foi Deus quem prometeu

Seus eus de tantos postos, eu endosso, mereceu

O toque fino e laço do abraço, apertado

De ti apartado, preso ao ombro já cansado

Por onde escorre o lenço branco alva agora meu






.

FRIO OLHAR

Ó filha Ofélia minha

Ofélia, o mar já te sabia

Oferta a fé que não nos vinha

No frio olhar de Hameleto

Um Dueto, havia

O mar e o rio versos à prosa

A dúvida de ser ou não ser rosa

Ó velha, em mim, a má, pulsante ira

Se vira, contra o feitiço, enfeita mal

Feito jasmim, o broto seco fira

A moça na louça, de riso maternal

Ó filha, a fértil Ofélia

No rio, no riso nosso, te prometo

No frio olhar de Hameleto

Ofélia, o mar já te sabia






.

O SOL ROMEU

O sol em nós desfaz os nós

Refaz a dor, e faz à sós

Desata e mata o que é amor,

Desmata e ata tudo após,

Se põe deitado em seu calor

E só escuta a própria voz 

Escapa à terra nata, erra a data

Espera Deus queimar os teus 

Pagãos de alma, deitam pigmeus

No céu - a cama de quem ama

Na sua ardência, o drama inflama

E regressa  o sol Romeu



.

COSMOLÓGIKA - Parte III - Albergarias

Degenera
E Combina
Carbono e alma, poeira e lembrança
Para fazer existir o ser
Que dança
Ilumina e explode
E fere, ionizado, o calor supernovo
Interestelar, constante
Do amor
Infinito e inacabado.
E a chama rarefeita espanta
A ausência do todo
Na presença do mantra
À tecer as veias de ódio
Que o silêncio criou.
Inferno sem alma
Aos sóis de pedra
Aquece os ventos imóveis perdidos na imensidão.
Alguns dirão: é Deus

Outros, razão.

Crimes da criação - I

Houve um tempo como o agora, cinza, onde todo encontro era secreto, aos ventos cortantes e verticais correntes, de um ar silencioso e rarefeito.
Houve um lugar como o agora, distante, onde toda lembrança era esquecida, rapidamente, na magia translúcida de um Deus abandonado.
Houve um espaço que se chamou agora, onde tudo o que se há já foi, e será, como sempre, presente, na ideia do ser que a tudo fantasia.
Éramos apenas um, transbordado, espalhado pelas esquinas vazias. Éramos o filho direto do cosmo pagão, no espaço sem Deus, sideral, navegando na eterna ausência de tudo, vitimado pela lembrança – que nunca foi matéria.
Éramos mercúrio. Soando atomicamente à caça de teu par. Expulsos a fórceps do mundo da matéria – o paralelismo diabólico.

A última vez que o vi ele estava confortável, sentado em uma cadeira de pedra flutuante, espetando com uma pequena adaga um galo negro que jorrava sangue. Vestia um paletó de lã cinza. Corpo de menino, longos braços e cabeça de elefante. Olhava lascivo enquanto controlava a lua, presa à ponta de sua língua áspera. Na praia, montanhas em formato de cabeça de cavalos escondiam o sol avermelhado, que iluminava esqueletos de aves gigantes, passeantes daquele ar sujo e denso.

plástiko

couraça que não é pele
perfume sem fragrância 
boca sem lábio

homem sem sexo
costela de curvas
núcleo de mãe-terra

do caos na arte
arranca ar, da água e do mar
e do olho a lágrima

e do petróleo, o plástico
pra aquecer a dor
de sentir ou não ser 


do belo - I

o belo que beliscou o bélico
e amado Armando, no braço,
tinha traço psicodélico,
e quando sóbrio, um embaraço.

e o beliscado então irado
e armado, fiel e evangélico,
mandou bala de atravessado
no peito, e bradou, colérico:

que o belo arda no espaço
de deus, vilão aristotélico,
e o feio se dobre, por cansaço
pecando, enquanto histérico!

assim termina eterna luta
beleza é luz, não se disputa.

ausenta

Eu que não mais me sou
E nem me era, quando todo te fui
Antes de ser, aos muitos, os poucos
Pedaços da ideia de mim
Ou daquilo que nos fora, à um
E pelos muitos que não éramos, à ti
Sou aquele que não mais lhe é
Sou aquele que não mais tem fim

Sou a tua parte que nunca foi de mim





.

homossina

o fogo – prenúncio
de morte e tempestade, antes raio vermelho
que faz impuro, o céu antes espelho
das águas – o anúncio.

no domínio das chamas – o homem se aquece
e esquece de dissecar, assa
a presa sem pressa, essa – a prece
do humano, cuja fome não passa.

ali se estica, crânio e coluna
a pinça – desgruda, da mão o polegar
à uma, que implica andar
o bípede, na terra firme ou duna.

fez-se então racional pela mentira e animal pela verdade

e o sapiens de mente demente e sápida
que evolui, se rápida
como a pólvora que deu ao combate a mira
faz política - metalurgia – pelo carvão que fira


como calos em Aquiles – aqueles que nele arde




.

Síria de nós

Somos a Síria de nós mesmos,
somos o Putin cidadão cansado, 
na poltrona que balança, 
a observar a neve cair, 
no chão rósea de história e sangue

Somos os Sunistas no balcão de couro, 
rasgado, tragando 
em suspiros a fundação da nova alma. 

Perto dos Deuses, longe dos humanos. 
Somos anjos
Somos os sítios e os sitiados, 
terroristas e aterrorizados. 

O terror é o brilho seco nos olhos 
de Assad
Somos uma pirâmide oca, 
que pede por armas e companhia. 
Chumbo, concreto e esperança. 

O nada toma forma
Diz ser Rebeldia e ataca 
com leões, o Estado de brinquedo, 
jovem e incapaz

Mas não somos a América! 
Não somos arsenais
Somos o segundo de dúvida, 
do cidadão que laça o dedo 
no gancho da granada


Somos a Síria de nós mesmos




.

a lua para ti

Roubaram os acordes do meu blues
E qualquer dor que eu merecia,
Além da bolsa de esperança sintética,
Com os ventos do meu norte e as vestes da minha alma,
Poucos cigarros e um isqueiro.

Dobrei a esquina na rua errada
E um outro me roubou a fome...
Perdi toda a inocência
Que encontrei hoje, tateando
A gaveta falante do meu criado-mudo.

Ainda bem, meu amor,

Que te dei a lua de presente.


.

Minhas marcas da vida dele

Disse a um alguém que não me ouvia
Que não há ferida,
Que não há dor, nem cicatriz...

Disse tudo a um alguém, que não sentia

Amor, ódio... Tampouco a alegria
De estar, ou saudade, de sair
Em busca do sorriso que traiu

Adormeci como um poeta

A sonhar com o cheiro de sangue
E incendiar lembranças, ao acordar

E então reconheci,

Sustentado pelas colunas angustiantes do nada,
O edifício que a dúvida ergueu
Quando esculpiu em ti, olhos claros de demônio

E me fez chorar

Nas muitas tentativas em vão
De escapar daquele que é dono do meu medo!

Perco a batalha ao abandono,
Na miserável esperança de não mais vivê-lo...




.

olhos de carbono

Enquanto madrugávamos no silêncio distante
Dos teus olhos de carbono
Uma lágrima minha Sangrou e separou em sais
O que era meu, teu, nosso e do mundo

E de rosto enxuto
Entreguei metáforas ao mal
Descansando as costas de papel
Na muralha de espinhos
Reservada aos vaidosos

E se nascer outra manhã
À fazer brilhar o que secou
E desferir o que a noite deixou rasgar
Quando o ouro opacou

Chamarei de odiosos

Os anjos da certeza
Que mudaram a sorte de lado
Com a espantosa leveza
A fim de opacar o que brilhou

Nos idos tempos outros

Enquanto madrugávamos no silêncio distante
Dos teus olhos de carbono

morrei-me

Dói. Mas é leve como um sopro.
Sutura na alma, endurece, gruda e refaz.
O corpo geme, lacrimeja, sofre e padece.
Cansa. Mata. Devagar.
Ausências aliviam.
Morte é o que se vai.
O presente dinamita.
Amar é conclusão, amar é técnica.
Viver é o acaso perdido.
É o forro do sótão.
É o substrato.
Rir é o pior remédio.
Feliz é o sacro não humano.
Dói. E não passa.
Reergue a falta em torres de aço.
 Enquanto à machadada crescemos.
 Pelo mesmo fio que tudo vê
 Em lâmina que tudo apaga.
 Me despeço e saúdo!
 Aqueles que tudo evitam.
 E gozam – profanos
 Na ilusão do futuro.

Cadela de Mineville



Perdi as esperanças num balcão de couro fétido
Bebi em memória daqueles que a mim brindaram
 Tombei lentamente pelas madrugas algozes 
Deitei com mulheres que nunca, jamais, amei 
De gole em gole sulfurei meu próprio esôfago 
Cantarolei as angústias de um passado distante 
E com a melhor roupa umedecida pelo pior perfume roubado
 Fiz promessas sinceras, fictícias, estapafúrdias 
Menti habilidades, prazeres, viagens e desejos 
Conheci o fundo do poço do pior dos infernos 
Sofri calado fingindo suspiros nas tardes ensolaradas
 Nunca admirei ver flor nascer ou ave planar 
E mesmo que minha vida tenha sido um blues 
E sem ter compreendido o valor real da alma 
Ao meu lado sempre tive os belos ladros famintos 
Carinhosos demônios urbanos perdidos 
Donos de suas ruas, cidades, lixeiras e sarjetas 
Maestros que orquestram a anarquia dos becos 
E trepam raivosos e sujos em qualquer lugar
 Amigos do homem, mas antes, criaturas do mundo
 De sentido aguçado e olhar profundo, sereno 
Sempre próximos à dor de quem os estima 
Justos, eternos e efêmeros, os melhores cidadãos 
Monstros alegres, vis, atentos e vorazes 
Até que uma cadela, certo dia, me latiu com ódio... 
Suspirei devagar, sentei num canto, e morri.
No quarto trago do meu cigarro...

pássaro vermelho

Aprendi com um pássaro vermelho,
Que pousou rápido e destemido,
Na janela, a ser eu o meu amigo
E fazer do outro meu espelho.

 Acordei de mim, desfiz os nós,
Sonhando velhos sonhos antigos,
Para que meu choro inimigo,
Chore a música na tenra voz

Que o alado e tímido
Amor, aquele pássaro vermelho
Ouviu. E bateu asas de albatroz.

Cresceu, partiu.
Aos todos idos,

E ao pôr do sol voou por nós.

O suicídio de Deus - Parte I

Abriu-se a porta de saída, no canto escuro empoeirado 
De corredor estreito e fundo, na sala do caos, ali ao lado 
Com seus móveis velhos, de lodo, mofo e umidade 
E vidraça bem trancada, quebradiça e pontiaguda 
Por onde rasga vento frio, e gela a alma de saudade 
Dos jovens tempos velhos... Ó mundo que não muda 
Pois o nada merece meu começo, meu verso ou regresso 
Chama então de despedida, o adeus de Deus ao universo 
E se entorpeço, na maldição dos encantos sonolentos 
À observar a raça humana, com os olhos hidratados 
Pela lágrima espessa que moldou os modelos barrentos 
É por não sentir a angústia, destes pobres bastardos....

APRESENTAÇÕES - Parte I

Amei com pressa e odiei com calma 
Li nos lábios os gritos da imensidão claustrofóbica 
Vomitei com os olhos a aberração parasita 
Sonhei acordado o pesadelo do medo do sono 

Tive saudade ao lembrar de um amor em vida 
Descobri que a dor é recordação da dor 
Queimei a gota do suor de pavor e ardor 
E expulsei a gêmea má que mora na minha alma 

Dancei no salão das armadilhas diabólicas 
Sobrevoei céu rósea de sangue e adorno 
Roubei estátuas vivas do jardim do desespero
E deitei nu no trilho quente da eterna partida 

Sou a esperança, filha do caos, sentença e lança 
Sou a dama sem rosto que lhe esconde o sorriso.

Cortante

Robusto inverno cutâneo
Que vens a mim
Orvalhando esperanças
De um sol que se esconde
E brilha
Quente, aquecendo "quandos" e "enfins"
Em algum lugar do passado
Das folhas secas
E árvores
De galhos queimados
...
Minha pele é o vento
Nos meus olhos alados


.

Das Águas - Parte III

No quando do quantum que cega

E renega, o gene

E treme, nos enquantos,

Um anjo em prantos

Geme, e enxerga,

O céu terreno... Ó mar, meu manto

De choro e espanto.

...


Onde nadam semideuses sem asas.



.

Apresentação


Se resta pouco ou algo assim

Sobram desamarradas as cordas de fios de sangue
Faltam as leituras dos olhos alheios
Sujam de dor o peito que infla
Diante do medo, terror, desespero e angústia

E esbanjam-se suturas comestíveis
E pedaços de feridas vivas

Para que a dor se faça humana
E o inferno desça à caça de uma poltrona confortável
Na primeira fila do espetáculo das almas doentes

Que a mesquinhez e avareza conduzem com o fêmur de condão 

...


Mas

Se resta pouco ou quase nada

Some devagar na transparência dos corpos
Desmoleculariza toda a razão
E fragiliza os dantes fortes soldados perdigueiros

Que vomitam as tripas de seus prisioneiros de guerra
E engolem as próprias gargantas

Para a ausência expandir poder
Abraçar os horizontes 
E cegar qualquer esperança

Sustentada pela aspereza da mão inimiga ofertada pelo desejo  

...


Muito prazer, amor.

Ode a quem se ama

Sol de todas as manhãs, me ensina a ser palhaço!
Lua que se esconde, vem das nuvens à mim!
E faça meu amor nascer num esboço ou traço
Crepuscular, em rosa-sangue e amarelo jasmim.

E tu, tarde - tempo perdido entre luz e treva!
Banha à ouro nu, nossos muitos lugares,
Em que o cheiro da saudade, ao bom gosto reserva,
As alegrias do encontro das bocas e olhares!

Lágrima, saia dos meus olhos corrompidos!
Hidrata rosto e pele que a melancolia secou!
Umedeça a dor ventante, que sopra aos muitos idos
E vindos, a semente que minha paixão regou!

E que o céu vermelho da vontade ensandecida
Teça em trama invisível nosso desejo em vida!

credo


Sigo na fé de tê-la, sem saber
Se ter fé é sabê-la, ou contar com a sorte

Pra se guiar a norte – é triste viver
Quando a fé te trai não há mais querer
Imóvel, com fé na permanência
De estar ciente que o norte é morrer
Triste é ter fé na própria demência
De querer em vida o que é da morte

O corte

Pois sabe o forte, que a fé é alheia
E o sábio que esbarra na ciência
Que pra ter fé é preciso tê-la
E sabê-la – ajoelha-te ao bendito

O que é óbvio precisa ser dito
Somos nós a outra vida que permeia
...

À fé, adeus

COSMOLÓGIKA - parte II

Muitos foram os dias em que eu nasci. E muitos foram os dias em que eu deveria ter morrido. O dia é sempre um dia e a noite é sempre escura. E sempre mais escura quando próxima do outro dia. Nunca houve uma noite em que eu deveria ter morrido. Nunca houve uma noite em que eu deveria ter nascido. As auroras são as gêneses, o dia só o é por que ele nasce oriundo de uma morte noturna. A noite em que eu deveria ter um dia, é a gênese que me falta. É a dor que escreve esse texto. Não há carícias numa carta. Palavras são manchas. A folha em branco é a gênese. Manchamos um papel para matá-lo. Para torná-lo aquilo que somos. A folha deixa de ser folha quando escrevemos. A noite deixa de ser morte quando o dia precisa nascer. Mas não há como se apagar a dor de um papel rabiscado. A gênese da dor é o final da tarde, quando se acaba um segundo parágrafo e o sol ofuscante de uma folha em branco se põe, sem ao menos citar o amor.


As noites escuras são nossos “eus” perambulantes. São a nossa oposição. O dia em que eu deveria ser uma noite ainda não aconteceu, apesar de presente. A felicidade é ter um dia após o outro, sem a nebulosidade intervalar da escuridão que nos resseca e aprisiona. O repouso é a antemorte, é o coma intuitivo da fuga que toda alma carece, é a realidade nua e crua. Retornamos sempre à posição fetal e caótica no ventre do nada. Adormece um corpo, perde-se a maquinaria. Resta uma alma inconsciente que sonha e se desfaz nas artimanhas de seu hospedeiro. Há em todos nós um inimigo, que se diverte sem nosso consentimento.


Há falhas na concepção da vida. Um ser é dia é noite, assim como as horas nascem e morrem. Aquilo que chamamos de viver é um hiato entre o eterno nascer e morrer – recurso prático de um sistema medíocre que se apresenta com altivez e aguarda por aplausos doentes da criação errante que o hospeda. Não há dias nem noites quando se vive. Transcorremos de um lado pra outro com rapidez e ansiedade; frágeis urgências presas a um eixo gravitacional, ao passo que um mundo gira quase que parado, sem nascer nem morrer, pois não tem alma. 

Repentes inocentes do amor secrecional - VII



Um leve golpe de ar passeou poro a poro, pelo a pelo, na derme única, rompendo a textura repousante da musculatura lombar.

Foi tinta transparente, lençol invisível, calor que esfria, sangue que combusta, e movimento imóvel, trepidante.

Na leveza despertada, deu-se a cosmologia da vida.

Moveu-se inteira em direção ao todo imóvel do universo da transgressão pacífica.

Rasgou com a espinha a variável Espaço e entregou-se às certezas de um tempo perdido noutro olhar.

Éramos parte do caos jogados num quarto de chamas improváveis, aquecidos pela goela umedecida da saliva alheia.

Um rosável ardor cintilante nas pálpebras quase abertas – a diabólica delícia do ócio carnal.

Nada se faz, apenas se contempla.

Fizemos o amor.

Como sempre, como nunca..

à guerra - I

Nasce à caça de tocar - reconhecer
Saciar a sede agora humana
Oxidar a garganta em intermitente grito louco
Trancando a casa da víscera quente
Até perder a sua parte corda

E deitar num colo sincero de lágrima...

Vai rosnar como lobo criança
Ante ao inverno da alma do mundo
Desde que sinta o que era um futuro
Vai fitar o pai sem sabê-lo 
E desejar o sono sempre distante
A completar quase mil noites de uma vida

E então a prima dor da infância
Na descoberta diabólica do erro possível
Enruga a pele jovem e tímida
E conduz à reflexão
A filha da honestidade e mãe do absurdo:

Glória!

Certeza ímpia de um caminho estreito...

Sob a bandeira da nação qualquer
À jurar boicotes, fundar família
Quer ser homem o menino guerreiro
Ser parte inteira, dentro, membro e braço
Tão somente em pensamento

Nas deprimentes fugas manchadas em vermelho
E trombetas que anunciam renúncias

E na noite do respiro curto
No bosque escuro das selvas da ira
Descansa morta a cabeça do soldado 
Num colo sincero cheio de sangue.

Desapego! Ensina um manual que não existe
Que o outro sinta a dor que é dele!
É capitão, amigo, líder e jorra...

Uma vida se esvai noutras mãos inocentes

Morre à caça de tocar - reconhecer 
E saciar uma sede agora humana
Oxidar a garganta em intermitente grito louco...

O guerreiro morre tal qual surge

Na dúvida de julgar os erros possíveis!

...

E eis que reflete nos olhos mortos da cabeça que sangra
Um veloz chumbo que então se hospeda 





Parto!


À glória - um lugar comum


Das coisas que me disse um pai - III




Na urgente permanência

Da ânsia de viver

Evita-se a morte

A cicatriz vira corte

E lança-se a lança!

Que de tão breve, nada alcança...

Pois que morra!

Todo o passado e particípio

E que atirem-se ao precipício

Agarrados na pata suja da lembrança torpe!

Escorra...

O sangue frio da morte coagulada

Pela parede dos vasos antes aquecidos!

Vai!

Condene, Deus, tudo aquilo que rompe

Teu laço secreto

Com o tempo incerto

De paz e compaixão

Pois o início era a ação

Não teus verbos corrompidos!

...

Edifica toda a dor no corpo frágil que desaba,

Maldito passado que nunca acaba!

Das coisas que me disse um pai - II




Das dívidas, o olhar

Irrefutável e auspicioso

Faltante no teu leito

Distante da tua hora

Diante do meu peito

Fatigante em plena aurora

É hoje meu segredo

Que mora na esperança

Ornando o teu passado

Que expulsa o meu medo

Da espera dos teus olhos

...

Rabisco em transparências, no muro que ergui, as tuas palavras ausentes...

Os homens também são aquilo que prometem.

Das coisas que me disse um pai - I







Sempre tua, que acompanha

Ereta e sem espinha,

A sombra negra de luz turva,

Do corpo, que dentro brilha!



Mas fora, em chamas

O coração metáfora

No pulsante pretérito,

De ardor e saudades



Que cala a esperança

...

A vida é antes uma idéia

O amor é antes larva fria

Fragmentos de Ausência


Debaixo da ponte óssea na Alameda dos Aflitos, um vento cortante me gela a medula, arde olhos e boca. Respirar dói – viver machuca.

Lentamente passo a passo no desequilíbrio pendular dos braços cruzados, o veludo falha e a lã esfria. Meu casaco é a alma morta dos homens que já fui.

Vagueia uma folha seca parda grossa e velha, em constante balé macabro sem direção. Apenas dança e me desafia, parando vez ou outra ao meu lado, como quem olha aos buracos dos meus sapatos na certeza de ter pena, e na ameaça vã de encontrar esperança, pois esta sabe que morreu.

Vejo uma goteira há uns dez, doze passos. Escorre gota a gota de uma fenda mal construída na parede cartilaginosa do encontro das hastes próxima à espinha central que sustenta a construção. Vejo também esforços, vejo ali, no rasgo, a vida começar a morrer. Não desvio, e umedeço o chapéu.

Chego então do outro lado. Um tanto apressado, um tanto feliz com o percurso. Um outro tanto, aquele que aguarda por aplausos e congratulações, deita exausto, e a minha quarta parte quer voltar. Minha pele dói, meus olhos ardem. Minha boca quer gritar, mas o coração está tranquilo.

Debaixo da ponte óssea, ali bem perto, na Alameda dos Aflitos, penso eu, que parou de ventar. Respirar doía, viver machucava...

Sigo rumando às veias de sangue viscoso.

A morte do palhaço


Que a mão da arte teça o casaco do velho louco
E que este encante a intangível plateia
Do universo dançante de astros e explosões
E que teu rosto volte a ser a bela criança
E tuas armas sejam novas e orgânicas
Como o velho nariz vermelho e grandes pés de ponta inchada
E boca borrada pelo sorriso que força
Na força de ser um velho tecido em tecido velho
Sem a artimanha do dilema que eis na questão
Ou na interpretação jocosa do eu que não mais atua
Na certeza do repente que improvisa em vida
Em projétil frágil que se ergue em cena
À decupar a própria matéria em moléculas de alegria
E não assustar o torpe transeunte que vislumbra pelo acaso
As piadas infames sem origem nem destino
E que volte a ser palhaço o velho louco
E seja sempre um louco o ser que volta
E respeitável seja com o público que anseia
Pelos urros de um prazer animal e desconexo
Pois entre os risos que coram o reles povo
Há dor, vida, morte, prazer e fuga
No movimento último que finda o espetáculo
Vai repousar tranquilo no camarim dentro do peito
E arrancar a maquiagem que esconde essências
Ouve-se então um último aplauso
E fecham-se as cortinas...

para Heitor


A vida grita em nós, cavalos...
Legião da força e do bem
Aos potros meninos, garanhão se curva
É turva a paisagem no cabresto azul...
É áspera a crina que divide o vento
E pesados são os deuses que nos montam
Equídeos! Uni-vos!
Somos a legião da força e do bem
E elegância frágil sincera
Dos galopes mitológicos e reais
Enquanto aos potros, égua mãe acolhe...
É curva a mancha da pelagem tordilha
Que o sangue do soldado borra
E longe é o destino que a morte nos lança
À lança, do guerreiro conduzido
No exército, na guerra ou na fuga
A vida grita em nós, cavalos...
Dragões humanos de olhar atento
Ao cavaleiro que se domestica
À improvável selvageria
Pois somos a legião da força e do bem...
Andando à luz de larga manga
A farda de lei, qual nada sabemos
É puro sangue que engrossa as veias
E nosso também o relinchar da dor
Pois a vida grita em nós, cavalos...

volte!


Rasguei a gota ao meio – na divisão do agora...   

Onde mora a vida   

E a bravura implora:

Que seja feita a cura da vontade ferida

Mesmo que arda meu olho que chora!

E que seja amor a lágrima contida

No quando da tua ida...

A lembrança me ancora!

E o retorno, que aflora

É antes despedida

Da dor que rasguei à gota dividida...

Volte, e não te vai mais embora!

sonetim....


Tudo de ti em mim é nosso
Tudo que posso em ti sou eu
Tudo teu é o que endosso
Ao todo meu que prometeu

E o todo vosso que sofreu
É o tudo em que me acosso
É um verso que emposso
Que tua alma ainda não leu

E teu café que eu adoço
Na manhã que já nasceu
É antes traço que esboço

Que o mundo ofereceu
Chama amor retrato nosso
E eu me amo por ser teu

Botão de amor

Um botão intumesce
A terra que seca e resta... 
E, às pressas, tal flor 
Esta, semeada na prece, 
Se fértil cresce. 
E na floresta, se for 
Flor de amor 
Floresce.

Colosseios

Ordem semântica de curiosa curva 
Monte que não se escala, flutuante – o anjo na nuvem 
Como a prima hora que rasga a terra em raio de sol 
Vermelho por dentro – e afora ofusca 
E brilha, como a láctea de amor que escorre da fenda 

E no passear vacilante de dedos reparto 
Pele, poro, ar e colo – em suave tremor febril de encantamento turvo 
E sólido – o corpo que se toca 
Vivo. 
Eu – no planeta do pecado sublime 

Onde anjos se olham... 

Cupidos corrompidos pelo desejar constante 
De pobres homens frágeis 
Amantes da plasticidade única – o corpo divino 
De fragrância diabólica 
E destino mundano, inefável. 

Composta como peça, parte a parte, canto a canto 
Sem cantos, nem quinas – projéteis orgânicos, maciez, natura... 
Na sina de ser o elo 
Entre o duro golpe, singelo e voraz do belo – existir 
E colidir – cria e criador 
Pelo amor – sim, zelo... 
E ensaio, o balé exuberante 
Ante a ausência repugnante dos atores errantes 
Que gritam ao meu ouvido 
No quando suspirante - em teu seio 
Ouço tudo, inquieto e repousante... 

E me escapa, sem receio 
E sincero - o "Amo" que não cala 
Mas traduz em fala, o que antes persevero... 

Que mora ali, nas saliências que venero - e que o sorriso prometeu 
Um coração alheio - O meu coração teu

à mãe futura


Deste ventre puro, que até então
Apenas beijei, em gestos de paixão
Surgirá, do semear, o resultante
Herdeiro, deste amar constante

E tu, que me esposas incessante
Aos prantos, na luz de vida primeira
Acalentará o fruto, em tua mão guerreira
Diante do presentear da existência

E este, que invade nossa essência
Tens de mim, adornos teus
E de ti, os olhares meus

Tens o gesto da força tua
E a incerteza, que ainda flutua
No início de cada jornada

Serás de teu filho, eterna e divina
E deste esposo, que por ti reclina
De orgulho e devoção, serás rainha

Pois, doravante, empossada
Pelo trajes de mãe celestial
E imaculada, és tu, completa
Esposa amada, e de nós repleta









Elogio do som

Dá um toque na pureza estagnada e satisfaz as tentações do repouso,
Altera à direção contrária e acalenta o silêncio físico tenebroso,
Penetra o corpo egoísta e mergulha no mar de escandalosos pensamentos,
Digere pela maquinaria orgânica sangrentos processos barulhentos.

Vive debruçado sob a alma errante dos calados homens literários,
Instrumentaliza e corrompe a verdadeira intenção de todos os diários,
Baila funéreo e deslizante com as penas presas na ponta de um pincel,
faz a imagem viver a paisagem ante à inquietude morfética do papel.

Crê que o silêncio é a ausência da complementação que sustenta a essência,
Manifesta a vital presença pelos gritos da mãe ao gerar a existência,
Provoca a selvageria humana postulada em sinceros urros de prazer sexual,
Fortalece a ameaçadora supremacia do lider assustando o menor animal,

Permite que o tonel de vinho embriague sem transbordar pela opaca taça,
Esconde e protege sua única e aparente virtude para facilitar a caça,
Garante ao universo cósmico sua eterna companhia,
Projeta na explosão a ideia da noite e do dia,

Faz-se presente em todos os momentos da história,
Encanta a platéia daqueles que utilizam para a glória,
Enfeitiça malvados ladrôes oceânicos pela beleza criada por seus devaneios,
Dá tranquilidade aos fins após os ruídos dos meios.

Buraco Negro


Nada, nem mesmo a luz de ti escapa
Distante de Deus - a força motriz dos calabouços variáveis!

Que não se vê e não se sente.

O temor molda-te a face, para o além-infinito!
Rasga o espaço-tempo
E se esconde no horizonte de evento
Das intangíveis albergarias,
E tronos de Zebus,
Refletindo um círculo maldito!
Que sangra em cosmologias...

Ante a luz que reduz e conduz
O tempo-espaço,
Dos anjos seminus – que lançam ao vento
Único, do movimento que induz,
Um quantum ao momento - se ausenta do compasso.

És,
Maciça e estelar – esférica vítima!
De força gama, áspera, membranosa
E eruptiva – filha da inexplicável e legítima
Sorte!

Aos humanos, a vida. Ao universo, o colapso...

E assim reina astuciosa - eterna morte
Da alma constelar eternizada em traço!
Se fora supernova, és mãe a entropia
Mestra da partícula, do silêncio cósmico - pura energia!

Metáfora divina que norteia o desapego
Ilumina-nos então, pai Buraco negro!






Das formas como se entende o amor

Das formas como se entende o amor, de como este se molda. Das formas, não conteúdos. Das gélidas armadilhas, dos calores fascinantes. Das fases do amor às faces do amor. Do amor, sim, sabe-se, que nada se sabe. Das certezas do amor, restam as dúvidas. Dos amores próximos – distantes improváveis sabe-se, de longe, que tudo é perto, tangível, vivo, físico. ... 

Dos amores da alma, das verdades do amor. Do amor virtuoso ao amor viciado. Do amor motivado ao amor casual. Do amor impossível à impossibilidade do amor possível. Do amor aforismo ao amor prosa. A poesia do amor – cântico vibrante, embriaguês, reflexo. O amor é a tônica. ... 

Dos muitos amores ao amor positivista. Do amor posse - a alma gêmea. Da ideia de amor ao plano infalível. Da universalidade da carne, do amor fricção. Do amor primeiro – descobre-se único. Do amor que morre - a frustração. Feitiço. Amor magia, amor humano, somente. ... 

Do amor divino ao amor plástico. Do amor que infla ao amor que suga. Dos amores outros, noutros. Do amor aquele, que não este – amores vários. Amor um. Amor só. Da falta de amor ao amor próprio. Do próprio amor do outro. Amor que não é nosso. Existe, apenas.

delírio

Com brutalidade, vem gozo silencioso...
E sigo trêmulo, nas entranhas da lembrança
Qual fragrância ímpia do cabelo que embriaga
A julgar a verdade nua, ante a temperança.

E na cólica do teu ventre vem a dança
A enrijecer-te o seio, que solitário clama
Em par com teu olhar, que perdigueiro chama
Meu toque áspero e o meu beijo jocoso.

Denuncia-nos então um frêmito pulsante
Que abençoa e apunhala este pobre amante...

Mas sempre presente, lasciva mão nos afaga
Em suave toque secreto, voraz, libidinoso...

elogio à cegueira




Estreito e enigmático, de clarão cortante
Que não se exibe, em raio a guisa
De um toque apenas. Sensível e pulsante
Sabe então o cego onde toca e pisa.

E nas entrelinhas de um texto mal lido,
Sob escuridão e piscadela do globo ardente
Reclama à memória de um sol sentido,
Que queima e reina das trevas à mente.

Pois sem ver é que se fala em sentir,
Na manhã somente, do ir, do vir
E da dor de ser o outro que não mais se enxerga,

E se perde em tonturas, e o destino posterga.
Como a alma que vê no sorriso a esperança,
A cegueira é o sentido que o corpo não alcança.

"das impossibilidades"

De ti sei pouco, ou quase nada
e pelo amor fiz muita coisa errada...

Caminho feito à trilha, deixando marcas
Buscando voltar antes do destino...
e destas surgem então as farpas
Que sobrou do meu eu menino:

Vontade de ser adulto,
De fantasiar as façanhas de um crime.

E depois, no silêncio dos olhos confessantes,
Na solidão da noite eterna e sublime,
Os olhos fajutos, antes flamejantes,

Me observou do alto, forte e astuto,
Um único desejo, que em silêncio grita...

O amor é terreno, dói, excita.

Repentes Inocentes do Amor Secrecional - VI

Das ruas é você
o tempero, a beleza
a leve aspereza, do totem ser

já que muitos te montam
cavalgam, desabam
gritam em silêncio
ou em gemidos,

no teu colo babam...

e por trás das facetas
de cada busca, fuga, habita
na mente, eterna punheta

pois puseste em ti o posto
da outra que aposta em teu esposo
do fiel cálice ao cale-se jocoso

as cenas de um casamento - união de fé e incerteza

viva a Puta deusa

Repentes inocentes do amor secrecional - V

A tua tez que tanto aquece,
com um triz, enaltece

poros e pêlos,

cicatrizes e zêlos.

Diz-se, nas esquinas, da arrepiada cutis,
que quando se ama,
tensiona e proclama,
em leves tremeliques.

E o movimento que pincela
passeando curva a curva,
torna a dama delirosa
tímida, singela donzela...

Tudo que te tegumenta me provoca

E invoca, minhas aflições e medos.

É minha alma que te toca!

...

o Diabo mora na ponta dos dedos

Repentes inocentes do amor secrecional - IV

a alquimia das secreções ensaiam na tua língua...

separando o viscoso
do fino, e o líquido
do plasma - o gozo que te cria

fundindo o Elixir

que aprisiona
e trancafia na mandíbula
o aroma do meu sêmem

e a espessura do meu pau...

e quando surge faringeal
com a goela me apertando
no balé das mucosas, passeia
pelo freio lingual, não freia

a minha vontade trêmula

de gozar pra sempre
te alimentar de mim.

mas

num repente, passa, se perde...

...

só nos resta repetir!

Repentes inocentes do amor secrecional - III

aquela puta velha da esquina da insanidade
que me oferta o seio murcho, todo dia, toda hora

guarda na bolsa de couro, suja e descascada
um coração inocente, macio, rósea
que bate inseguro, à espera de um amor

...

a cada trago, a cada olhar
o salto, a pele, as rugas
a tosse, os dentes, tudo!
tudo é amor!

é Deus que se disfarça...

repentes inocentes do amor secrecional - II

essa fenda melada com cheiro de mundo,
perto do osso, pulsante, cheia de sangue
que me nega, me engole e me deseja
fecunda idéias, mágoas, languidez
e faz o resto do universo parecer desncessário, decrépito e ridículo!

me corrompe, me ofende, me rebaixa
me suga a alma, mas com calma, vem, e se encaixa
com tanta magia, perfeição e natura...

como será a vida ápós a morte,
se os anjos não nos tocam?

COSMOLÓGIKA - parte I

Desperta-se do sono primeiro e único, a unidade prima, habitante única do inabitável nada, como molécula hospedeira de um corpo inexistente.
Combina ao mover-se, um encontro de ondas, que dantes imóveis e alunas, desprende-se do organismo repousante.
E assim se dá o primeiro movimento.
Gerador constante da trepidação involuntária. Quantum enigmático da associação de deslocamentos.
E assim se dá o primeiro espaço.
Move-se o espaço em si, em giro celular. Ondas se unem em exercício de acúmulo. Caça-se a luz.
E assim se dá o primeiro tempo.
A direção resulta da frequente perturbação do movimento. O nada reflete ao nada, e o fluxo sustenta a si. O tempo nasce infinto.
E assim se dá o primeiro átomo.
O tempo perde sua gênese. O cosmos precisa ser eterno. Tudo procura a si.
E assim se dá o primeiro núcleo.

A Biologia das fraudes sexuais - Manifesto parte II

O aristotélico e o atomista são estáveis.

Qualquer cometa cuja cauda se aproxime da terra após um contato direto com qualquer corpo que transmita muito calor e energia, pode, facilmente, provocar uma forte tempestade e inundar a terra toda, a ponto de levantar a necessidade de elaboração de um esquema rápido e eficaz para salvar espécies.

Há analogias entre as fecundações humanas. Há hiatos entre as concepções de geração e origem.

Todo mundo posterior às catástrofes é desprovido de ordem e de proporção. O caos reina em toda gênese. Toda.

Todo pensamento ousado nada têm de contrário a razão.

Atrito + humor + secreção = princípio básico da unidade geradora de vida.

O sêmem é a mistura do todo.

A larva é antes ovo, que já foi crisálida. A borboleta é a vida após as mortes.

A biologia das fraudes sexuais - Manifesto - Parte I

Corpo é certeza.

Força estática e força dinâmica. A lei do repouso não é natural.

Atração é certeza.

O corpo reproduz a ciência. A lei da atração é a lei dos corpos.

Acaso é falha. O estéril é falha. O útero é a partícula do cosmo.

Flerte é falha. Sedução é falha.

O Humano é falho.

O pressuposto é humano. O pressuposto é falho.

A regra é única. Os gêneros são dois apenas.

A regra é holística.

A secreção é divina. O sangue é a parte humana do todo matéria.

Odores são essencialmente humanos.

Todo desejo é metafísico.

Fetiche é revelação. O universo é intangível.

Toda matéria tem energia. Não existe nada além da matéria.

O pecado prova a existência de Deus.

O desejo de pecar é sublime.

Todo pensamento é propriedade do corpo.

A insanidade é prima. É a ação direta do pensamento.

Todo corpo é inicialmente impenetrável.

Tudo é movimento.

O humano é resultado.

Cada parte é um todo indivisível.

O corpo humano une as partes.

Todo sistema necessita do centro. Todo centro é potência.

Todo sistema combina intensidade, força, potência e distância.

Todo núcleo é insubstituível.

Movimento gera equilíbrio.

Toda lei natural fundamenta seus princípios na simplicidade da ação.

Memória é luz incidente.

A luz quer penetrar. Sempre.

O impenetrável reflete.

Reflexão é luz própria em potência.

Da Ásia - Parte I

Hebreus antigos, transeuntes sedentos
Protegidos pelo céu e benção de Abraão,
Coléricos se viram entre sóis e ventos,
Na miragem de um Deus, egípicio ou não.

Alado às páginas da redação suprema,
Um homem tecia destinos nas alturas,
Mas a senectude é contrária ao dilema
Rascunhado em vão na sagrada escritura.

Pois na última linha de seu livro quinto,
Indagou Moisés, que na Torá legislou:
"Do divino pacto, dúvida pressinto:
A Canaã prometida, de que adiantou?

Se o povo de Adonai, fiéis caminhantes
Erguera um Estado no deserto esquecido,
Pode homem oriundo do abismo distante
Destruir as colunas do templo perdido?"

No mapa é soturno, qual felino criminoso,
Inferno asiático da fronteira enfraquecida,
Impávido e robusto como um leão ardiloso
Que acabara de trair manada enfurecida.

Terra de Israel, és infanto Estado velho,
Reduto do mártir e da face mascarada,
Potência que reluz o nebuloso escaravelho
Como praga egípicia, eterna e condenada.

Das águas - Parte I

No atlântico do oriente, de infinita rota,
Onde cíclopes se armam, frente a terra do poder,
Mata ele a ibérica sede, e encharca a velha bota,
Até o verdejante caminho balcânico do saber.

Curva-se diante do portentoso Gilbratar,
Para sentir Suez, e tocar o irmão vermelho,
Em contínuo encontro com o Negro parceiro,
Acena à Bosforo e Dardanelo, findando o passear.

Segue sápido e aquecido pelo vento do Saara,
E no Jônico profundo resfria o seu azul,
Nos braços de um primo Adriático ele pára,
Sempre navegante rumando a norte ou sul.

Água que tudo forma - é de Deus filha única,
Qual o belo indivisível - mar mediterrâneo,
Tão forte e sólida - é a verdadeira túnica,
E o sangue viscoso deste leito subterrâneo.

ao santo negro talhado em madeira molhada

Um santo negro talhado em madeira molhada,
De vermelho sangue da árvore bendita,
É filho de todos nós, do imaginário divino,
Da dor severa e da história escrita,

É poderoso ser do universo, habitante
Alado das montanhas verdes e calmantes,
Onde tecelãs de materna razão,
dedica-nos o destino em vislumbre constante,

E fortes homens trabalham, dedicados,
A transpor da natureza, energia inacabada.

E o santo negro talhado em madeira molhada,
No altar sustenta em punho a espada,
A aguardar o espetáculo qual finda
A vida humana, no colar de Deus pendurado,

Qual cordão sem ponta, círculo de força
Ou reta eterna traçada em fio dourado.

Abençoai aquilo que nas profundezas
Do imaginário humano, a dor fez adormecer,
E que o fio de tua espada acomode
Gota uma nosso sangue, para o ser renascer.

recorte da peça "Memorável Desventura"

Todo o rude peso da suavidade harmônica
Daqueles versos calados frenéticos sem tônica,
Com as sílabas das verdades expressas no opus,
Faziam tremer-lhe a vista à vislumbrar os corpos....

Corpos estes deitados na vastidão, no mistério da imagem,
Enfeitando e acalentando Narciso da margem...

E, suspirante, pela fonte decorada de notas sinistras,
O ar se fez humano, e tangível, sem rastro nem pista,
Ouviu-se então um cântico grotesco, e ante à face no lago,
Tombou-lhe a alma... Cai o corpo do consciente oriundo...

É a vaidade humana - rendida às caprichosas manobras do fascínio,
Que anseia por teu suicídio, como a música Narciso...
Gerando a força motora que sustenta a mente do mundo,
Instintiva e pura, suave e dançante, de majestoso improviso...

Ainda ouço as notas soltas, que se encontram em meio à devoção.
A saudar Narciso, e velar tua paixão...

Gracejos de Amor - II

... ofende a Deus a ímpia elegância
daqueles que julgam o amor, fraqueza
pois nas colinas da divina realeza
Quer o velho amar, sem distância

Assim o faz com tua criação
Ofertando ao homem, ante à razão
Sentidos, desejo e beleza

Aos amantes, a lua posta
de cor pecaminosa, sangue brilhante
Enquanto Ele, sorrindo aposta
que viva a cria teu prazer cintilante...

Gracejos de Amor - I

Tivesse eu com tigres lutado
ou sob o jônico degolado serpentes,
sentir-me-ia menos culpado
por amar assim, severamente...

Foi o encantamento voráz do repente
que a fez surgir na taberna ao meu lado...
Mefistofélica noite de sonhos ardentes,
fáustica esperança de fugir alado...

Por meses cavalguei jactante
atrás do cheiro de romã pulsante
atrás do rastro da bela passante...

Atrás da semideusa de olhar fremente
que tornou meu céu mais fulgurante
e meu ser mais inconsciente...

minha mulher, minha amante.