delírio

Com brutalidade, vem gozo silencioso...
E sigo trêmulo, nas entranhas da lembrança
Qual fragrância ímpia do cabelo que embriaga
A julgar a verdade nua, ante a temperança.

E na cólica do teu ventre vem a dança
A enrijecer-te o seio, que solitário clama
Em par com teu olhar, que perdigueiro chama
Meu toque áspero e o meu beijo jocoso.

Denuncia-nos então um frêmito pulsante
Que abençoa e apunhala este pobre amante...

Mas sempre presente, lasciva mão nos afaga
Em suave toque secreto, voraz, libidinoso...

elogio à cegueira




Estreito e enigmático, de clarão cortante
Que não se exibe, em raio a guisa
De um toque apenas. Sensível e pulsante
Sabe então o cego onde toca e pisa.

E nas entrelinhas de um texto mal lido,
Sob escuridão e piscadela do globo ardente
Reclama à memória de um sol sentido,
Que queima e reina das trevas à mente.

Pois sem ver é que se fala em sentir,
Na manhã somente, do ir, do vir
E da dor de ser o outro que não mais se enxerga,

E se perde em tonturas, e o destino posterga.
Como a alma que vê no sorriso a esperança,
A cegueira é o sentido que o corpo não alcança.