ausenta

Eu que não mais me sou
E nem me era, quando todo te fui
Antes de ser, aos muitos, os poucos
Pedaços da ideia de mim
Ou daquilo que nos fora, à um
E pelos muitos que não éramos, à ti
Sou aquele que não mais lhe é
Sou aquele que não mais tem fim

Sou a tua parte que nunca foi de mim





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homossina

o fogo – prenúncio
de morte e tempestade, antes raio vermelho
que faz impuro, o céu antes espelho
das águas – o anúncio.

no domínio das chamas – o homem se aquece
e esquece de dissecar, assa
a presa sem pressa, essa – a prece
do humano, cuja fome não passa.

ali se estica, crânio e coluna
a pinça – desgruda, da mão o polegar
à uma, que implica andar
o bípede, na terra firme ou duna.

fez-se então racional pela mentira e animal pela verdade

e o sapiens de mente demente e sápida
que evolui, se rápida
como a pólvora que deu ao combate a mira
faz política - metalurgia – pelo carvão que fira


como calos em Aquiles – aqueles que nele arde




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Síria de nós

Somos a Síria de nós mesmos,
somos o Putin cidadão cansado, 
na poltrona que balança, 
a observar a neve cair, 
no chão rósea de história e sangue

Somos os Sunistas no balcão de couro, 
rasgado, tragando 
em suspiros a fundação da nova alma. 

Perto dos Deuses, longe dos humanos. 
Somos anjos
Somos os sítios e os sitiados, 
terroristas e aterrorizados. 

O terror é o brilho seco nos olhos 
de Assad
Somos uma pirâmide oca, 
que pede por armas e companhia. 
Chumbo, concreto e esperança. 

O nada toma forma
Diz ser Rebeldia e ataca 
com leões, o Estado de brinquedo, 
jovem e incapaz

Mas não somos a América! 
Não somos arsenais
Somos o segundo de dúvida, 
do cidadão que laça o dedo 
no gancho da granada


Somos a Síria de nós mesmos




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a lua para ti

Roubaram os acordes do meu blues
E qualquer dor que eu merecia,
Além da bolsa de esperança sintética,
Com os ventos do meu norte e as vestes da minha alma,
Poucos cigarros e um isqueiro.

Dobrei a esquina na rua errada
E um outro me roubou a fome...
Perdi toda a inocência
Que encontrei hoje, tateando
A gaveta falante do meu criado-mudo.

Ainda bem, meu amor,

Que te dei a lua de presente.


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