Fragmentos de Ausência


Debaixo da ponte óssea na Alameda dos Aflitos, um vento cortante me gela a medula, arde olhos e boca. Respirar dói – viver machuca.

Lentamente passo a passo no desequilíbrio pendular dos braços cruzados, o veludo falha e a lã esfria. Meu casaco é a alma morta dos homens que já fui.

Vagueia uma folha seca parda grossa e velha, em constante balé macabro sem direção. Apenas dança e me desafia, parando vez ou outra ao meu lado, como quem olha aos buracos dos meus sapatos na certeza de ter pena, e na ameaça vã de encontrar esperança, pois esta sabe que morreu.

Vejo uma goteira há uns dez, doze passos. Escorre gota a gota de uma fenda mal construída na parede cartilaginosa do encontro das hastes próxima à espinha central que sustenta a construção. Vejo também esforços, vejo ali, no rasgo, a vida começar a morrer. Não desvio, e umedeço o chapéu.

Chego então do outro lado. Um tanto apressado, um tanto feliz com o percurso. Um outro tanto, aquele que aguarda por aplausos e congratulações, deita exausto, e a minha quarta parte quer voltar. Minha pele dói, meus olhos ardem. Minha boca quer gritar, mas o coração está tranquilo.

Debaixo da ponte óssea, ali bem perto, na Alameda dos Aflitos, penso eu, que parou de ventar. Respirar doía, viver machucava...

Sigo rumando às veias de sangue viscoso.